quinta-feira, 28 de abril de 2016

LIVROS & ENTRELINHAS - OS REMÉDIOS VENENOSOS DE AGATHA CHRISTIE (parte 3)





AGATHA CHRISTIE: A RAINHA DOS VENENOS (parte 3)






Mr. Shaitana riu discretamente.
— Deve haver muitas envenenadoras secretas... que jamais foram descobertas.(...) — Um médico também tem suas oportunidades — continuou Mr. Shaitana, pensativo.
— Protesto — exclamou o Dr. Roberts. — Quando envenenamos nossos pacientes é totalmente por acaso. — E soltou uma sonora risada.

(Cartas na Mesa)





A  DIFERENÇA  ENTRE  O  REMÉDIO  E  O  VENENO  ESTÁ  NA  DOSE



Já dizia o ditado popular. Nesta 3ª parte de artigos sobre o método de envenenamento utilizado por Agatha Christie em suas obras, apresento alguns dos remédios e outras substâncias terapêuticas que serviram como arma de assassinato, uma vez que, se aplicados em doses erradas ou mal administrados, podem ser mortais.

Nesta parte 3 da série Agatha Christie: rainha dos venenos,  além da digitalina e da morfina já descritos na 1ª parte de A Rainha dos Venenos, apresento vários medicamentos dos quais a escritora lançou mão para liquidar suas vítimas.


Caso não tenha acompanhado a série Agatha Christie: rainha dos venenos desde o início, confira os artigos anteriores clicando nos links abaixo:


Parte 1 – Os TOP 5 venenos mais utilizados por Agatha Christie: 




Parte 2 – Os venenos que não são comuns de serem usados como arma de assassinato e os venenos curiosos ou inusitados:  





Parte 4 – As plantas perigosamente venenosas e a polêmica dos venenos que teriam sido inventados por Agatha Christie:
http://agathachristieobraeautora.blogspot.com/2016/05/curiosidades-o-jardim-de-venenos-de.html




Parte 5 – O demais venenos utilizados por Agatha Christie e as histórias em que o veneno não foi informado:

http://agathachristieobraeautora.blogspot.com/2016/05/livros-entrelinhas-o-fascinante-e.html


 
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BARBITÚRICOS









Tentou a respiração artificial, mas não havia nada a fazer. O nosso médico legista chegou logo em seguida e confirmou o tratamento dado.

— Qual foi o remédio pra dormir?

— Veronal, creio. Em todo o caso, um da linha dos BARBITÚRICOS. Tinha um frasco de comprimidos ao lado da cama.

(Cartas na Mesa)


O que seria dos romances de detetive – ou até mesmo das séries policiais da TV – sem a clássica overdose de comprimidos para dormir? Agatha Christie também lançou mão deste método de envenenamento, matando suas vítimas com barbitúricos ou comprimidos calmantes, os quais, quando ingeridos em doses excessivas, eram fatais. A escritora utilizou algumas poucas variedades, sendo em sua maioria o barbital, também conhecido como Veronal ou Medianal, dos quais falo em seguida.





BARBITÚRICO:  VERONAL








A mulher continuou a sacudir devagar a cabeça.

— Ela está morta. Morreu enquanto dormia. Que horror.

Poirot encostou-se à ombreira da porta. (...)

— Mandou chamar o médico? O que foi que ele disse?

— Tomou uma dose excessiva de comprimidos pra dormir. Oh! Que lástima! Uma moça tão boa. Essas drogas são um perigo... uma coisa horrível. VERONAL, ele disse que era.

(A Morte de Lord Edgware)


Veronal foi o primeiro barbitúrico comercializado. Apesar do gosto levemente amargo, o organismo desenvolvia tolerância ao Veronal, requerendo então dosagem mais alta, o que resultava com muita frequência em morte acidental por overdose.



Utilizado em: Cartas na Mesa; A Morte de Lord Edgware; O Assassinato de Roger Ackroyd.





BARBITÚRICO:  MEDINAL






- Lady Stanley morreu há alguns anos, não foi?

- Há dois anos e meio, aproximadamente - respondeu o advogado, sem deixar de fitar Poirot.

- De que morreu ela?

- De uma dose excessiva de um medicamento para dormir. MEDINAL, se a memória não me falha.

(Morte na Rua Hickory)



Outro nome para o Veronal, o Medinal era um popular comprimido para dormir, um barbitúrico que, da mesma forma, levava o organismo a criar resistência às doses baixas, levando o usuário a ingerir doses cada vez mais altas, podendo ser fatais. 


Apareceu em Morte na Rua Hickory; Uma Dose Mortal.





EVIPAN






Poirot interrompeu-o.

— Um simples reconstituinte N-metilo-cliclo-hexenil-metilomalonil uréia — disse Poirot, escandindo as sílabas untuosamente.

— Conhecido mais comumente como EVIPAN. Usado como anestésico pra operações rápidas. Injetado intravenosamente em grandes doses produz desfalecimento instantâneo. É perigoso usá-lo depois de medicação de veronal ou qualquer outro barbitúrico. Reparei no machucado do braço dela, onde era óbvio que tinham injetado alguma coisa na veia. Uma insinuação ao médico legista e a droga empregada foi facilmente descoberta por nada menos que Sir Charles Imphrey, analista do Ministério do Interior.

(Cartas na Mesa)


Muito bem explicado por Poirot no trecho de Cartas na Mesa acima, o Evipan possui efeitos sedativos e foi utilizado como um poderoso analgésico de injeção intravenosa Derivado de barbitúrico, era vendido como ácido ou na forma de sólida como sal.








BELLADONNA  ou  DATURA  ou  ATROPINA







— Nunca vi pessoalmente nenhum desses casos — disse ele — porém ouvi falar muitas vezes. Envenenamento com DATURA. Acaba pondo a pessoa louca.

— Exatamente. Bem, o elemento ativo da datura é muito próximo — senão idêntico — ao de um alcaloide, a ATROPINA, que pode ser obtido da BELADONA. Preparados de beladona são comuns e o sulfato de atropina chega mesmo a ser livremente receitado para tratamentos oftalmológicos. Repetindo a receita e comprando-a em vários locais com as várias cópias é possível obter-se uma quantidade considerável do veneno sem levantar qualquer suspeita. O alcaloide pode ser extraído dele e posteriormente introduzido, digamos, em um creme emoliente ou em um tubo de sabão de barbear.

(The Labors of Hercule)


O bom é que Agatha Christie já explicou tudo sobre a Belladonna na passagem acima. É um veneno conhecido desde a antiguidade, muito usado pelo Imperador Augustus para liquidar seus inimigos. Tanto as folhas como as frutinhas são tóxicas. Como Agatha explica acima, era usado em pequenas doses para tratamento oftalmológico.

Aparece em: Os Trabalhos de Hercule; Os Quatro Grandes; Tragédia em Três Atos; O Touro de Creta; O Polegar de St. Peter; Mistério no Caribe.




ADRENALINA  +  PROVOCAÍNA






— Acabei de receber o relatório do médico-legista, sobre Amberiotis. Em poucas palavras, ele morreu de uma dose excessiva de ADRENALINA e PROVOCAÍNA. Teve um colapso e foi-se. Quando o pobre homem nos disse, ontem à tarde, que estava se sentindo mal, não estava mentindo. Adrenalina e provocaína é uma mistura que os dentistas usam como anestésico local; Morley errou na dosagem. Quando percebeu o erro já era tarde demais.

(Uma Dose Mortal)


A  combinação de adrenalina com provocaína possui funções medicinais direcionadas a problemas cardíacos. A dose errada pode causar um infarto ou uma parada cardíaca – ambos fatais. Apareceu em Uma Dose Mortal.






FISOSTIGMINA  ou  ESERINA






—Eu sei que o senhor é um homem muito ocupado e não tomarei o seu tempo. Mas precisava comunicar-lhe que as nossas suspeitas se confirmaram. Seu pai não morreu de morte natural. A morte foi em resultado de uma dose muito elevada de FISOSTIGMINA...  mais conhecida como ESERINA.

(A Casa Torta)

Alcaloide derivado da planta denominada feijão de Calabar, típica da Nigéria, é utilizada no tratamento de glaucoma, doença de Alzheimer e hipotensão. A overdose, no entanto, causa diarreia, vomito, náuseas e pode levar à morte.

Foi utilizada em A Casa Torta.




COCAINA





— Todos os bombons continham COCAÍNA?

— Não. A moça comeu um. Constatamos a presença da droga em dois outros da camada de cima. O resto não continha nada.

(Poirot falando com Dr. Graham em A Casa do Penhasco)


Em 1880, a empresa farmacêutica Merk propagava a cocaína como remédio contra o vício em morfina do qual sofriam os soldados mutilados. Em 1884 a droga foi utilizada em cirurgias ópticas e nesta mesma época Sigmund Freud tornou-se um entusiasta da cocaína, dedicando um livro inteiramente a ela. A droga foi utilizada em diferentes usos medicinais, como o da foto acima: para aliviar a dor de dente. Todavia, era uma época em que não se faziam testes científicos confiáveis – quando se faziam! – e não se tinha ideia das consequências terríveis do uso da droga.



Foi utilizada em A Casa do Penhasco e O Caso do Baile da Vitória.






OUABAÍNA  ou  ESTROFANTINA






Ele estava com a saúde perfeita. O que ele estava fazendo com uma seringa no bolso? Eu fiz então a autopsia mirando em uma certa possibilidade. Encontrei ESTROFANTINA. O resto foi fácil.

(Dr. Haydok falando com Miss Marple em O Problema da Cuidadora)

Ouabaína ou estrofantina-g é uma substância orgânica derivada da planta da família das Apocynaceae, que cresce na África e na China e é utilizada em emergências em casos de falha do coração, embora ainda se façam estudos a respeito. O uso incorreto pode, todavia, levar à morte.



Foi utilizada em O Triangulo em Rhodes; O Caso da Cuidadora.







HIDRATO DE CLORAL









Por ocasião de recentes crises de dores fora-me receitado um soporífero — HIDRATO DE CLORAL. A cada repetição da receita pusera de parte dois ou três comprimidos, até acumular uma dose mortal. Quando XXX trouxe um pouco de conhaque para XXXX, depôs o copo em cima de uma mesa, e ao passar por essa mesa deitei a droga no conhaque. Foi fácil porque, naquela ocasião, ninguém suspeitava ainda de nada.

(O Caso dos Dez Negrinhos)


Usado como sedativo e hipnótico, é formado pelo cloral com adição de uma molécula de água. Juntamente com o clorofórmio, é um subproduto do cloral e apresenta a fórmula molecular C2H2CI3O2. Em altas doses leva à morte.



Foi utilizado em O Inimigo Secreto; O Mistério dos Sete Relógios; O Caso dos Dez Negrinhos.



TRINITRINA







— Essa substância é venenosa? — perguntei.

— Não, monsieur.

— Que efeitos produz?

— Abaixa a pressão sanguínea. É indicada para alguns males do coração, angina pectoris, por exemplo. Alivia a tensão arterial. Em arterioesclerose... Eu o interrompi:

— Ma foi! Esse palavrório está complicado demais. Acaso a TRINITRINA faz o sangue subir ao rosto? — Certamente.

— E se eu engolisse dez ou vinte desses comprimidos, o que aconteceria?

— Não o aconselharia a tentar — foi seu comentário seco.

— E apesar disso, ainda diz que não é venenosa?

— Há muitas substâncias não venenosas capazes de matar um homem — ele respondeu no mesmo tom.

(A Caixa de Chocolate)


Também conhecida como nitroglicerina, trata-se de uma substância que funciona como relaxante muscular e também em casos graves de hipertensão. Aparece em A Caixa de Chocolate; Cai o Pano.




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